quinta-feira, 30 de maio de 2013

Uma estreia: uma canção que faz a despedida.



Uma estreia de uma canção faz a despedida de Maria Bethânia, ou seja, a cantora faz sua saída discreta de cena na esfera humana. 
Ela, uma interprete chamada Maria Bethânia, não sei se pela primeira vez, fez a composição de uma canção que não há adjetivos suficientes no vernáculo da língua portuguesa para descrever a situação que eu observei.
Ela começou a fazer a composição da canção em um palco dentro de um teatro em uma das suas turnês. Ela cantava para milhares de pessoas. Bethânia anunciava que aquela seria a sua última canção. Todos pensavam que aquela seria a última canção do espetáculo, e foi. Foi a última canção do show da vida da artista.
Não conhecíamos Maria Bethânia como uma compositora. Tínhamos acesso a Bethânia pelo seu alto nível de interpretação oferecido nas composições alheias.  O alheio era tão fascinante e eficaz  que nunca ninguém  acusou a artista como uma simples reprodutora da criação alheia. Mas nessa passagem do espetáculo que relato, intitulada de a última canção de vida, Maria Bethânia fez a sua unigênita composição. Ela não conseguia acreditar e nem perceber o que acontecia naquele intervalo de tempo.
Ela começou cantarolar de uma maneira incrível. Cada palavra trazia a produção de milhares de imagens e reflexões sobre a condição humana a todos os presentes. Todos visualizaram cada imagem de palavras no ritmo e memória de cada um. Tudo era a voz de Bethânia significando no mundo. Tudo trazia maravilha e maravilhamento no mesmo instante.
Com o decorrer da canção, a aparência de Maria Bethânia se transformava. Ela vivia uma espécie de transformação ou uma metamorfose em si. O sangue da artista coagulava realizando um célere enegrecer. E quando ela falou a última palavra da canção, caiu. Caiu em meus braços, fechou os olhos e fez sua despedida do mundo no mundo.
Todos pensavam que aquela atuação de Maria Bethânia fazia parte do espetáculo. E fazia. Todos aplaudiam, gritavam e encantavam-se com a cena presenciada. Apenas eu tinha consciência da eterna despedida de Maria Bethânia. Nada tinha sido enunciado. Eu apenas compreendia e sentia o que acontecia. Não fazia divulgação alguma do que presenciava. Vivia o momento da realização com uma consciência sem direcionamentos práticos e não sei o que aconteceu depois, pois acordei e havia um dia esperando uma feitura. Desse sonho eu aprendi uma coisa: Bethânia morreu cantando no meu sonho e ainda está viva para receber este relato. 

Rave de Ranoli

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