sábado, 18 de agosto de 2012

Começos e términos: A Paixão segundo G.H


A Paixão Segundo G.H

_ _ _ _ _ _ estou procurando, estou procurando.
É que um mundo todo vivo tem força de um inferno.
Só eu saberei se foi a falha necessária.
Depois dirigi-me ao corredor escuro que se segue à área.
Então, antes de entender, meu coração embranqueceu como cabelos embranquecem.
Foi então que a barata começou a emergir do fundo.
Cada olho reproduzia a barata inteira.
Eu chegara ao nada, e o nada era vivo e úmido.

Perdão é um atributo da matéria viva.
Eu fizera o ato proibido de tocar no que é imundo.
Então, de novo, mais um milímetro grosso de matéria branca espremeu-se para fora.
Finalmente, meu amor, sucumbi. E tornou-se um agora.
Pois o que eu estava vendo era ainda anterior ao humano.

Neutro artesanato da vida.
Nem mesmo o medo mais, nem mesmo o susto mais.
Dai-me a tua mão:
A vida pré-humana divina é de uma atualidade que queima
Eu procurava uma amplidão.
E voltei-me de chofre para o interior do quarto que, na sua ardência, pelo menos não era povoado.

Mas há alguma coisa que é preciso ser dita.
Pois em mim mesma eu vi como é o inferno.
O inferno é o meu máximo.
Eu estava comendo a mim mesma, que também sou matéria viva do sabath.

Ela sentiria a falta do que deveria ser seu.
Por que a coisa nua é tão tediosa.
Não devo ter medo de ver a humanização por dentro.
Aumentar infinitivamente o pedido que nasce da carência.
O gosto do vivo.

Nossas mãos que são grossas e cheias de palavras.
E que não contei tudo.
O divino para mim é o real.
Falta apenas o golpe de graça – que se chama paixão.
A desistência é uma revelação.
A vida se me é, e eu não entendo o que digo. E então adoro. _ _ _ _ _ _
Clarice Lispector





Nenhum comentário: